sexta-feira, 17 de abril de 2009
A CANÇÃO DA ESTRADA – 1955 – Direção: Satyajit Ray
Satyajit Ray é dos maiores diretores do cinema, certamente o maior da Índia, e esta “Canção da Estrada” inaugura a chamada trilogia de Apu completadas com os filmes “O invencível” e “O Mundo de Apu”. Trata-se de uma jóia rara, tão extraordinária quanto os melhores filmes já realizados e, por motivos os quais jamais entenderemos, nunca foi exibido no Brasil, sendo lançado recentemente pela Silver Screen.
Não posso deixar de fazer menção ao ganhador do Oscar “Quem quer ser Milionário” feito pelo inglês Danny Boyle, filme que não assisti, e nem da atual moda da Índia instaurada com a novela da Globo, que também não assisto; logo, não escrevo com tanta propriedade; no entanto, interesses comerciais à parte, parece existir uma certa exploração tanto da miséria (no filme) quanto do exotismo (na novela) que, ao invés de aproximar para uma identidade entre seres humanos, realça os seus contrastes sociais e étnicos. Eis a oportunidade para assistir a dolorosa, poética e profundamente humana história do jovem Apu, acompanhando-o desde seu nascimento.
Neste primeiro filme, vemos sua família num vilarejo de Bengala com os pais, a avó (figura única no cinema) e a irmã. São extremamente pobres e as dificuldades o levam a mal ter o que comer e, diante dessas condições, anuncia-se a tragédia. Mas não é o retrato (ou a exploração) da miséria o que move o filme, nem mesmo a sua superação, mas é o mostrar a vida a fluir “apesar disso” ou “com isso”. Pois os olhos de Apu são puros, curiosos, plenos para o mundo, a pobreza sendo um de seus aspectos, não o único. No mesmo mundo de Apu, como de todos nós, existe a tragédia da morte, da doença e da miséria, mas também há o correr livre pelos campos, o se banhar nos rios, o ter o carinho dos pais, do conhecer as pessoas e lugares.
É um filme de descobertas, em mais de uma acepção, levantando o véu para a Índia e seus hábitos, embalado pela extraordinária e envolvente trilha sonora composta por Ravi Shankar.O tom quase documental do filme, apresentando o cotidiano da família de Apu, o vilarejo e suas pessoas, a Índia e suas paisagens em uma belíssima fotografia em preto e branco, confere a modernidade à obra de Satyajit Ray. Não o faz com crueza, como poderíamos inadvertidamente supor: o faz antes com tal delicadeza como a nos mostrar que na realidade, e apenas nela, os fatos tristes ou alegres seguem necessariamente juntos, nos mostra o que está no mundo com todos os seus encantos e vicissitudes.
Por mostrar pessoas simples e seus dramas, torna-os universais, como no neo-realismo dos italianos Rosselini, De Sica e Visconti, como no brasileiro “Vidas Secas” de Nelson Pereira dos Santos, como em toda obra do iraniano Abbas Kiarostami e do japonês Yasujiru Ozu. A esses nomes, que respeitam a vida, as pessoas e aos que amam o cinema, deve sempre se juntar o nome de Satyajit Ray.
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