Diários de Motocicleta – Dir. Walter Salles
É a história da iniciação de
um mito, mas Walter Salles preferiu um registro menor, da descoberta da America
Latina pelo olhos do jovem Ernesto Guevara, junto com seu amigo, numa versão de
Dom Quixote cujo Rucinante é um dos personagens, ao menos na primeira metade do
filme, e que dá nome ao filme, a motocicleta cambaleante La Poderosa II, uma
Norton 500 CC.
Para Walter Salles a estrada é um
campo de descobertas, ou seja, de descobrir uma essência através da aventura,
seja pelo impulso da juventude como neste Diários, ou seja pelo acaso em, por
exemplo, Central do Brasil, seu outro filme.
É a jornada do herói que, no caso
do filme e na vida, não o será sem dificuldades e riscos. Ao contrário, o jovem
Ernesto é asmático, e todas as cenas das crises são angustiantes. Mas o que o
empurra pra frente?
Há atualidades neste belo filme
de Walter Salles como os mineiros chilenos, sendo explorados nas minas de cobre
(cujo soterramento, e espetacular resgate televisivo nos aponta que a
exploração continua) ou chocante corte de Machu Pichu para Lima do Peru para a
cidade de Cuzco.
Sensíveis interpretações, assim
como a fotografia suave, toda construção se dá através do mergulho e das paisagens
aos olhos do jovem Che.
O que Che Guevara representa
ainda, neste mundo anódino, capitalista e impessoal? Onde fica a aventura, as
descobertas, a indignação e a busca daqueles que estão “do outro lado do rio”?
Não sei, mas desconfio que enquanto as pessoas se sentirem tocadas e tenham o
impulso de também embarcar nesta viagem, ainda haverá o desejo e o chamado para
a aventura, com ternura e paixão, e que não morreu na selva da Bolívia, como o
que aconteceu com Che, e nunca morrerá enquanto ainda houver injustiças,
preconceitos e exclusão neste mundo.